domingo, 24 de janeiro de 2010

VAMOS COM O JOÃO - VENCIDOS, MAS NÃO DEGENERADOS

Com Joãozinho Ribeiro

“A história não é uma ciência e não tem muito a esperar das ciências; ela não explica e não tem método, melhor ainda, a História, da qual muito se tem falado nesses dois últimos séculos, não existe”

O autor desta afirmação, Paul Veyne, é professor do Collège de France, doutor em Letras e especialista em história da antiguidade Greco-romana, nascido em 1930, na cidade de Aix-en-Provence, na França. O texto integra a introdução do livro que contém dois ensaios seus, reeditados recentemente pela Editora Universidade de Brasília: “Como se escreve a história” e “Foucault revoluciona a história”.

Com o respeito devido ao vigoroso ensaio que o mestre francês desenvolve no referido texto, onde trata, preliminarmente, do objeto da história, para em seguida tecer considerações sobre as diversas formas de sua compreensão, e finalizar com a noção de progresso histórico do ponto de vista sociológico, não nego que acendeu em minha memória uma surrada e oprotuna pergunta: afinal, o que é a história?

Como se escreve a história dos indivíduos numa sociedade desigual como a nossa? Que vultos merecem figurar no panteon das nossas considerações? Que atos praticados em diferentes épocas poderão permanecer como relevantes para as gerações presentes e vindouras, como símbolos da solidez de caráter e da generosidade humana em relação aos seus praticantes?

A história não tem sido generosa com o reconhecimento dos vultos maranhenses que a viveram e contaram. Traço ilustrativo desta minha inquietação é a tremenda dívida que o nosso estado possui com muitos dos seus filhos ilustres, no que respeita ao papel que desempenharam em circunstâncias difíceis, contribuindo com suas ações, enquanto sujeitos desta história, para a superação das relações vexatórias de semi-feudalismo a que nossa população permaneceu e ainda, em boa parte, permanece submetida.

Alguns destes “símbolos vivos da nossa nação” se projetam para além dos bons e maus tempos, como os guerreiros do Poema Sujo de Gullar, agasalhados em nossas consciências feitos exemplos de vida e dignidade, porém sem o justo reconhecimento público, e muitas das vezes até banidos do teatro das memórias, cujas cenas, cada vez mais, parecem ser apropriadas pelo monopólio e pelo protagonismo daqueles que só contribuíram para atirar na lata de lixo da história a própria História do Maranhão.

Faço essa leitura após uma releitura do livro “Vencidos e Degenerados”, do imortal escritor maranhense, Nascimento Moraes, saudado por um outro francês, Jean-Yves-Mérian, professor da Universidade da Alta Bretanha e autoridade crítica da obra de um outro maranhense, Aluizio de Azevedo, que assim se expressou nas primeiras páginas da 4ª edição, publicada no ano de 2000, em comemoração à passagem dos cem anos do nascimento do Professor Nascimento:

“Graças a um estilo onde a vivacidade dos diálogos permite-nos apreciar certas descrições demasiado longas, o escritor faz-nos descobrir com realismo os mecanismos que animam esta sociedade conservadora, medíocre, impregnada de idéias racistas e de toda sorte de preconceitos.

Aos que conheceram O Mulato a leitura de Vencidos e Degenerados traz a impressão de um mundo já conhecido e também a concepção de um sentimento de impotência de uma cidade decadente que vive da lembrança da época em que era a terceira metrópole do Brasil. Certas passagens desta crônica da vida do Maranhão são verdadeiros documentos sociológicos”

Esta breve introdução se associa ao atual momento, em que se misturam combates truculentos à 3ª edição do Plano Nacional dos Direitos Humanos e a um personagem que ao mesmo tempo é tema, sujeito e co-autor de uma das mais belas páginas escritas da História do Brasil – Neiva Moreira – deputado federal, preso político, perseguido, exilado, anistiado, que dedicou toda sua exemplar existência ao combate às injustiças sociais perpetradas pelos donos do poder em nosso estado e a luta incansável a favor das liberdades democráticas em nosso país, estendendo-a a muitas outras nações, contra a dependência colonial implantada a ferro e fogo pelas grandes potências imperialistas da época.

É de Neiva Moreira o histórico e brilhante discurso proferido na Câmara Federal, em 1958, pesaroso pelo falecimento do Professor Nascimento Moraes, de cujas laudas extraio o trecho, com o qual encerro este artigo, desejando o rápido e pleno restabelecimento da saúde do seu autor, um dos maiores vultos da história política deste nosso Maranhão, que tive a grande honra de dirigir as palavras de saudação, na condição de representante estudantil, quando da sua volta do exílio, em 1979:

“Falo-vos, sim, da tristeza que se abateu sobre a minha terra, com a morte sentida desse notável maranhense, que só dispunha de uma arma, a inteligência, legando-nos o exemplo excepcional de uma vitória revolucionária contra o preconceito de cor e da riqueza, num meio onde velhas praxes aristocráticas, herdadas da Colônia e do Império, não permitiu acesso fácil aos que, como Nascimento Moraes, preto e pobre, humilde e sem proteção, tinham que abrir caminho rompendo a floresta a golpes de talento e pela bravura moral”.

Que essa bravura moral do Neiva e do Nascimento possa servir de farol para a presente e futuras gerações do nosso sofrido estado.

Como militante da Cultura e dos Direitos Humanos

4 comentários:

Iran Avelar disse...

candidato-me a blogue parceiro: www.urbanosantos.blogspot.com

Anônimo disse...

Acompanho mesmo de longe, a trajetória de vida e a militância política e cultural de Joãozinho Ribeiro, inclusive como secretário de cultura do governo Jackson Lago. Esse é um maranhense, cuja vida nos enche de orgulho, pela sua coerência e compromisso com um Maranhão mais digno para todos.
O seu texto é primoroso, e merece ser lido por todos os maranhenses, sobretudo pelos mais jovens - que necessitam de referência e de conhecer a historia do seu Estado. Vou seguir este blog. Um abraço.

severinosouzaneto@gamil.com disse...

Acompanho mesmo de longe, a trajetória de vida e a militância política e cultural de Joãozinho Ribeiro, inclusive como secretário de cultura do governo Jackson Lago. Esse é um maranhense, cuja vida nos enche de orgulho, pela sua coerência e compromisso com um Maranhão mais digno para todos.
O seu texto é primoroso, e merece ser lido por todos os maranhenses, sobretudo pelos mais jovens - que necessitam de referência e de conhecer a historia do seu Estado. Vou seguir este blog. Um abraço.

quallyz disse...

ARTIGOS COMO ESTES É QUE NOS ENCORAJAM PARA LIVRAR O MARANHÃO DO QUE TEM DE MAIS PODRE A OLIGARGUIA DOS HONORÁVEIS BANDIDOS.
MARTINS