quinta-feira, 12 de novembro de 2009

VAMOS DE ROBERTO ROCHA - AVESSO

Com Roberto Rocha

Com Avesso do Avesso

A pior coisa que têm os maus costumes é serem costumes”, dizia o padre Vieira. Não tanto por serem maus, que estes mudam, mas pela capacidade de se acostumarem.
Mais triste que as cenas de incivilidade que São Luís assistiu na última quarta-feira, no que seria o simples lançamento de um livro, foi a encenação feita para justificar o deplorável espetáculo.

De um blog, cevado na oligarquia, ouvimos que “não deixa de ser uma provocação o lançamento do livro em São Luís ”. Vejam bem: o lançamento de um livro sobre um político maranhense não poderia acontecer na capital do Maranhão! Não estamos falando de um ato realizado no portão da família Sarney, ou mesmo em praça pública. Trata-se de um evento realizado em espaço privado, em entidade sindical, de responsabilidade pública, com ampla divulgação.
Não poderia haver ato falho mais escancarado: toda a cidade de São Luís é território privado de uma família. É, por assim dizer, o quintal deles, que demanda alvará para se ter acesso. Do contrário, é ato de provocação insultuosa contra o qual se insurgem, como de costume, os estafetas da honra alheia, sempre de prontidão para as suas seletivas indignações.
Do gesto em si, perpetrado por um grupo de jovens, temos a compreensão que sempre nos merecem os mais jovens. A rebeldia, o arroubo, quem pode atirar a primeira pedra? Mas o Maranhão deve ser o único lugar do mundo em que a insurreição juvenil é em defesa do status-quo. No mundo todo, a contestação da juventude se identifica com os ideais libertários, a solidariedade, o respeito às diferenças, a denúncia das iniqüidades. Só aqui erguem-se barricadas para defender a Bastilha, para proteger Luís XVI e Maria Antonieta.
E mais uma vez, para nossa vergonha perante o país, arma-se uma ficção em nome do direito de livre expressão, como se os agredidos fossem os agressores. Curiosa interpretação da liberdade, justamente por aqueles que sempre a desprezaram. Em nome de que princípio pode-se defender o direito de quem quer que seja entrar em um recinto privado e insultar os presentes? Não aprenderam a valiosa lição do juiz Holmes, da Suprema Corte americana, que em 1919 formulou de maneira lapidar a pergunta sobre que lei protegeria um homem que falsamente gritasse ‘fogo!’ num teatro fechado, provocando pânico? Com essa sentença delimitou o direito à liberdade de expressão como um meio para a descoberta da “verdade política”, não um álibi para a ação inconseqüente.
Chegam agora ao absurdo de acusar, vejam que conveniente, um adversário político combatente como o deputado Domingos Dutra. Logo ele, um lorde da política, em quem até mesmo os adversários reconhecem a lhaneza no trato e a lealdade no enfrentamento.
Assim é o Maranhão. Aqui os derrotados governam, os agressores prestam queixa, os opressores reivindicam liberdade, os censores proclamam o direito à expressão, os oligarcas se vangloriam da democracia, os empregados defendem a honra dos patrões, os jovens lideram o reacionarismo. Somos mesmo o avesso do avesso.
Como diria o padre Vieira, o que mais ofende é a força dos costumes, que vão se naturalizando e, no nosso caso, passando para o Brasil a imagem de um Estado completamente irreal, uma galápagos política, como disse o governador Jackson Lago.
Curioso é notar que tamanha insensatez acabou por ter o efeito inverso do que desejavam os insensatos. Chamaram a atenção para um evento que deveria durar algumas horas e que agora perdurará em blogs nacionais, em sites de relacionamento, nas rodas de discussão, ampliando potencialmente os efeitos do livro que já desponta entre os mais vendidos do país.

Com foto Felipe Klamt - Timon 2009

Nenhum comentário: