sexta-feira, 4 de novembro de 2011

VAMOS DE JOAQUIM ITAPARY - A DIARRÉIA DO BEIJA-FLOR


Com Joaquim Itapary
Stanislaw Ponte Preta eternizou nos anais do humor os disparates lógicos e o “nonsense” dos denominados sambas de enredo compostos para agremiações carnavalescas. As letras da maioria desses sambas não passam de verdadeiros bestialógicos de presumidos poetas que, num palavrório incoerente, a título de produzirem obra de sincretismo cultural, misturam alhos com bugalhos e terminam compondo uma meleca de asneiras e tolices capaz de fazer rir até o mais sisudo frade de pedra. Ele mesmo – Stanislaw – compôs letra antológica conhecida do Brasil inteiro com o título de “Samba do Crioulo Doido”.
É uma tremenda e irretocável gozação com a falsa erudição dos compositores, ainda em voga nas escolas de samba. Em suas “letras”, esses bestalhões, a título de festejar fatos da evolução da humanidade, de modo incongruente misturam figuras da mitologia, da história, das religiões, das artes, das ciências e da literatura que jamais tiveram a menor ligação entre si e muitas vezes até se repelem, contradizem e opõem. Criam, assim, versões absurdas da História aplaudida por ululante horda de bobalhões e um número maior ainda de imbecis, de toda classe social.
A propósito, recebi, via internet, a letra do samba de enredo da Beija-Flor de Nilópolis, do Rio de Janeiro, patrocinada pelo contraventor Aniz Abraão Daví, que teria sido contratada para “homenagear” a São Luís pelo transcurso dos seus 400 anos, mediante pagamento de 10 milhões. Parece brincadeira, mas estou literalmente aturdido com tanta burrice. Jamais li coisa igual, desde que a Dona Cota Teixeira me alfabetizou.
Na minha ignorância em matéria de ornitologia, nunca imaginei que beija-flor, avezinha tão minúscula e mimosa, produzisse tantas fezes. Meu Deus, quem aprovou essa letra decerto perdeu o olfato e o senso de responsabilidade pública. É de estarrecer o primarismo da linguagem utilizada em homenagem à cidade-Atenas Brasileira.
Francamente, um grosseiro e inadmissível insulto às nossas tradições. Qualquer garoto do bairro da Madre Deus fará coisa melhor; e de graça. Transcrevo, para horror do leitor culto, o amontoado de umas 150 palavras das quais 12 beócios se servem para compor 26 versos denunciadores de ensandecimento coletivo, ou, quem sabe, de inatos dotes de asnice potencializada por alucinógenos reprimidos pela polícia antidrogas.
Pior é que, segundo circula na internet, esse bostífero samba de enredo custará os olhos da cara dos pobres maranhenses: Cada um dos 26 versos de pé-quebrado valerá R$ 384.615,39; isto é, se não erro na aritmética, cerca de R$ 67.000,00 por palavra! Tapem o nariz, pois aí vai o milionário cocô do beija-flor: “Tem magia em cada palmeira que brota em seu chão// O homem nativo da terra / Resiste em bravura / A dor da invasão.// Do mar vem três coroas / Irmão seu olhar mareja / No balanço da maré / A maldade não tem fé sangrando [singrando?] os mares/ Mensageiro da dor.// Liberdade roubou dos meus lugares / Rompendo grilhões, em busca da paz / A dor dos meus ancestrais.// Na casa nagô a luz de Xangô Axé [axé?] / Mina jêje [mina-jeje?] um ritual de fé / Chegou de Daomé, chegou de Abeokutá / Toda magia do vodun [vodum ou vodu?] e do orixá./ Ê rainha o bumba-meu-boi vem de lá / Eu quero ver o cazumbá, sem a serpente acordar.// Hoje minha lágrima transborda todo mar / Fonte que a saudade não secou// Ó Ana assombração na carruagem.// Os casarões são a imagem/ Da história que o tempo guardou.// No rádio o regae [ou reggae?] do bom// Marrom é o tom da canção// Na terra da encantaria [cantaria?] a arte do gênio João.”
Para exemplo aos excelentes poetas maranhenses eternamente de cuia na mão a pedinchar trocados para a edição de seus livros, hoje proporei na Academia a transcrição em Ata dessa genial diarréia “poética”. Afinal, não é todo dia que no Brasil se pode ler merda tão grande. É como diz um amigo: O canoro sabiá maranhense foi preterido por um milionário beija-flor cagão.
Como Colunista do Jornal O Estado do Maranhão

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