terça-feira, 8 de dezembro de 2009

VAMOS DE MHÁRION LINCOLN - CADÊ A MINHA HISTÓRIA?

Com Mhário Lincoln

“Exu intercedei junto a Olódùmarè e lhe peça para abrir os olhos de quem nos governa. São Jorge, Ogum, sejam flecheiros da bemquerença e tirem o floco de neve do pezinho da formiguinha…...”


ALÔ AMIGOS, estou em São Luís-Ma. Uma vida literária e folclórica intensa. Aqui, revejo amigos de infância, colegas de formatura e amigos do jornal e tv. Sinto-me verdadeiramente em casa. Só fico triste quando vejo a mesma coisa de anos acontecerem neste pedaço de terra. Nada ou pouca coisa realmente mudou: o mar belisca cada vez mais fundo a calçada da avenida litorânea sem manutenção. O cheiro da Lagoa da Jansen ainda se entranha na beleza verde do local. Poucas luzes iluminam o Centro-Patrimônio Histórico da Humanidade. Nas avenidas, algumas cópias de longos pedaços da lua-cheia. Os monumentos históricos pichados, abandonados ou retirados. Ei, onde está a velha Athenas Brasileira? O busto de Maria Firmina?

Faltou por 1 dia inteiro água no prédio onde fico. Luz, essa vez por outra me faz lembrar as serenatas ao luar que fazia quando jovem. O atendimento profissional é de provocar dor-de-cabeça. Lembrei da cuspalhada de um motorista de taxi desavisado pela janela afora, indo o cuspe amealhar-se no paletó de riscado de um Diplomata Suiço em visita ao Estado.

Vi a solidão sombria do mendigo à porta da igreja, estendendo a mão sem retorno. Do bêbado implorando o cigarro à porta de um bar da moda. O doente imolando-se na ferida da perna: “uma esmola pelo amor de Deus”.

De longe olhei Mario Fantasma vestido com a camisa do Sampaio, calção e meiões do Moto Clube e boné do MAC, os principais times de futebol da capital. Ainda parei para ouvir os clamores de um ex-jogador, aleijado, brigando na esquina por nossos destroçados times de futebol. Por onde andam Hamilton, Baezinho, o grande meia Rosclin, Raimundinho, o goleiro Marcial, o inesquecível Cabecinha que fez 26 gols enquanto estava no Sampaio Correia Futebol Clube e tantos outros que a história trazida pelo sopro do vento, no canto da viração, nos faz lembrar? Bem que poderiam estar em alma pendurados nas paredes de concreto do Panteon Bandeira Tribuzzi, enterrado nos confins da Praia da Ponta D’areia. O Castelão não tem mais o urro do boi tricolor ou vermelho-e-preto num dos maiores clássicos que o Nodeste já assistiu jogar.

Revi a prostituta sentada horas à fio na calçada da fama. E meus pés afundavam no fétido esgoto a céu aberto, lépido, correndo em busca do mar, à frente. Procura-se uma praia para tomar banho de água salgada. Salgada! Minha escolha foi única: mergulhar entre um aviso e outro de Impróprio para Banho.E de lá, vindo do único mergulho a que a coragem me submeteu, vi, ainda, um rapaz urinando debaixo do coqueiro para adubar a planta. Já na avenida, um carro de placa especial pára no estacionamento de deficientes, enquanto o cadeirante verdadeiro é carregado por boas almas, a fim de superar o intransponível meio-fio.

O sol, esse em toda época do ano, não cansa de enganar ratificando que no Maranhão “até o Céu Mente”, do saudoso Padre Antonio Vieira em seu Sermão aos Peixes. De repente tudo escurece e cai um pé d’água daqueles. Então é um tal de pular poça aqui, driblar enxurrada acolá, bueiros entupidos pela insaciável ganância de alguns. Uma tempestade insana que – dizem – emudeceu até os sinos da cidade. Sim, notei isso: os sinos de muitas Igrejas emudeceram. A hora do angelus não tem mais fundo musical.

Como não tem mais as estudantes do Rosa Castro, do Liceu, do São Luís, do Atheneu, nos paquerando das escadas greco-romanas da Biblioteca Pública, no Panteon dos Deuses da Literatura. O Teatro Arthur Azevêdo de imaculadas memórias repousa em paz encarando o que restou da antiga Faculdade de Direito do Maranhão, uma das mais antigas deste País. É a sina. A mesma sina paradoxal da rua da Saúde, onde ainda fornica o baixo meretrício. Ou da rua do Sol, onde a sombra é o extase, na tarde quente. Das flores, ou das Hortas, vítimas do implacável asfalto, coveiro das sementes que ainda insistiam em brotar.

Cadê Ana Jansen? Os cinemas Édem e Roxy? A chiquita Baiana? O Major Pereira, o Delegado Penha? Onde está minha história que vim desenterrar e ela, essa sim, mudou tanto? Submergiu na tromba d’água da boca do lobo, na rua onde nasci: Afogados. Foi levada pelo vento no rumo da croa, da Ponta D’areia e foi deitar nos braços do Rei D. Sebastião e no colo da Princesa Ina.

Axés, Orixás, Caboclos de pena. Encantados de Mina e Terecô. Encantados naturais, Pretos Velhos, Pai Joaquim, Pai Arruda, Tia Joana, Oxossis, Oxalás. Pais e Mães de Santo, Cambonos, intercedei por esta São Luís anfíbia, órfã de boa-vontade. Exu intercedei junto a Olódùmarè e lhe peça para abrir os olhos de quem nos governa. São Jorge, Ogum, sejam flecheiros da bemquerença e tirem o floco de neve do pezinho da formiguinha…

Como Editor-Chefe do Portal Mhário Lincoln do Brasil

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